sexta-feira, 17 de junho de 2011

Divisão do Pará: texto de um itaitubense que mora no Rio Grande do Sul


Em suas palavras, Weverton Cordeiro questiona se Santarém e Marabá não incorporariam exatamente o papel que tanto criticam: de capitais opressoras

(...)
proponho os seguintes questionamentos para os formadores de opinião da região, de modo que possamos discutir e entender plenamente a nova realidade que pode estar por vir:
1) Santarém está preparada para assumir o papel de capital de um novo estado? Em quais perspectivas (exceto econômica, geográfica e populacional)? Os parlamentares estaduais e federais de Santarém têm defendido o desenvolvimento de cidades menores e mais distantes do oeste do Pará, que tem pouca ou nenhuma representação política? Estão preparados para assumir o papel de capital de um novo estado? Quais são os sinais existentes hoje de que Santarém fará um trabalho (muito) melhor do que Belém fez?
2) As melhorias que a criação de Tocantins e Mato Grosso do Sul foram sistematicamente disseminadas, ou somente localizadas na nova capital? Qual a melhoria no IDH dos municípios mais afastados, nos novos estados? Compensaram os investimentos na criação das novas entidades federativas?
3) A população de Santarém seria tão enérgica na defesa de um novo estado se a capital fosse outra cidade, Rurópolis por exemplo?
4) Há movimentos no Sul do País que visam a independência do Brasil. Os ideais e as motivações nesses contextos são as mesmas defendidas pelos defensores do Tapajós. Devemos então defender um plebiscito para consultar a população do Sul sobre a mesma se separar do Brasil? Não seria usar “um peso e duas medidas” defender o nosso direito, e negar o deles?
5) As zonas administrativas criadas no Pará, com sede em Santarém e Marabá, não são alternativas à divisão do estado? Se não resolvem, por que resolveria a criação de um novo estado com sede justamente nessas cidades?
6) Todos os municípios da região têm a mesma empolgação que Santarém nessa divisão? Como lidar com uma eventual não aprovação da divisão do estado em cidades como, por exemplo, Itaituba e Altamira? Como os defensores da divisão sugerem lidar com essa decisão democrática?
Nos parágrafos a seguir, trato com mais detalhes cada uma dessas perguntas.
Eu concordo que temos sido sistematicamente abandonados pelo Governo do Estado, cujas políticas públicas tem sido mais voltadas ao nordeste do Estado do que para as regiões oeste e sudeste. Por exemplo, basta pegar o mapa do Pará e ver que há mais estradas estaduais no entorno de Belém do que em todo o resto do Estado. Houve mais esforços e investimentos para construir espaços turísticos em Belém do que obras de infra-estrutura básica em várias outras cidades. Quando alguém em Itaituba, Jacareacanga ou Rurópolis (por exemplo) precisa de atendimento médico especializado de urgência, precisa pegar avião (quando isso é possível) e percorrer grandes distâncias para obter tratamento em Santarém (quando não Belém). Enfim, motivos não faltam para acreditar que muito do interesse para dividir o estado de fato surgem desses problemas. Eu também não acredito, ao contrário do que pensa a imprensa do Sul/Sudeste, que a principal questão seja o custo da criação dos novos estados. Ao contrário, deve-se discutir o que eles podem representar para a melhoria do IDH nessas regiões (que é muito baixo, por sinal).
No entanto, uma profunda discussão deve ocorrer em torno da criação do novo estado e todos os aspectos envolvidos. Por exemplo, muito se argumenta que a divisão do estado do Tocantins trouxe inúmeros benefícios para a população de Palmas. Vi vários comentários de pessoas pró-divisão usando esse ponto como argumento, e inclusive li sobre pessoas que moram em Palmas que a cidade é um celeiro de desenvolvimento. Minha pergunta seria: e quanto ao interior do estado do Tocantins? Como as cidades que compõem o estado eram ontem, e como são hoje?
Se hoje a região oeste do Pará vive essa situação de abandono com Belém sendo a capital, qual a garantia que temos que amanhã não será o mesmo com Santarém? Em outras palavras, qual a vocação que Santarém tem demonstrado de que pode ser a capital de um novo estado? Que a cidade tem a economia mais forte da região, sem dúvida. Que possui melhor infra-estrutura, isso é inegável. Que é melhor localizada geograficamente para ser a capital do futuro estado, também. Só que esses argumentos não são válidos para defender uma nova capital. Fosse assim, Brasília não teria sido capital do Brasil, e Palmas não teria sido capital do Tocantins. Santarém realmente terá condições de fazer o que Belém não fez pela nossa região? Tem feito isso até hoje? Os deputados santarenos têm lutado com afinco pelos problemas de Novo Progresso ou Jacareacanga? Talvez falte melhor noção do que tem acontecido na minha região. No entanto, sinceramente conheço pouquíssimas iniciativas dessa natureza.
Muito pelo contrário, as iniciativas vindas de Santarém não tem me dado a plena confiança de que as benesses da divisão seriam amplamente distribuídas, na minha opinião. Por exemplo, recentemente o Aeroporto de Itaituba teve problemas por falta de infra-estrutura e precisou ser fechado. Os comentários que eu li (inclusive aqui no blog) era de que Santarém ia precisar de mais investimentos da Infraero. Um dos motivos argumentados, entre vários outros legítimos, era que Santarém iria precisar ampliar o seu aeroporto para dar conta dos passageiros de Itaituba que passariam a utilizá-lo. De qualquer forma, apesar de termos uma grande bancada parlamentar do oeste do Pará nos representando, foi finalmente com o Dep. Dudimar Paxiúba que a questão do Aeroporto de Itaituba tomou relevância. Eu não vi o vice-governador do estado, um santareno, tomar partido e lutar pela melhoria do aeroporto local, limitando-se a dizer que o aeroporto é uma concessão ao município. Há também outros casos, como a criação de uma Área de Livre Comércio especialmente para Santarém (o que pode trazer prejuízos para a população do restante da região que ficaria de fora, vide caso de Manaus / Amazonas), e a tentativa de Santarém de fazer com que Blairo Maggi instale em Santarém um porto de escoamento de soja, sendo que esse já havia demonstrado interesse em instalá-lo em Miritituba. Resumindo, Santarém tem realmente buscado a unidade e o desenvolvimento das cidades que fazem parte da região candidata a formar um novo estado sob a sua jurisdição?
Não há dúvida que a futura capital Santarém, a exemplo de Palmas (TO) e Campo Grande (MS), irá se beneficiar da divisão. Muito provavelmente isso seja o motivo das várias carreatas que ocorreram na cidade comemorando a aprovação do plebiscito. O problema, no entanto, é se esse desenvolvimento pujante ficar restrito a Santarém. Ao defender a criação do novo estado, eu fico com receio de passar a pagar (via impostos) pelo desenvolvimento somente de Santarém, a exemplo do que hoje fazemos com Belém. Além disso, será que a aprovação do plebiscito seria recebida com tanto entusiasmo, se a capital fosse instalada em outra cidade, por exemplo Rurópolis? Os santarenos continuariam defendendo tanto a idéia de divisão do estado? Sinceramente, não acredito que isso aconteceria. E não sejamos muito ingênuos de achar o contrário.
Eu moro em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, e há muito tenho visto várias pessoas defendendo a separação do Rio Grande do Sul do Brasil. Os argumentos são os mesmos defendidos pelo oeste do Pará. Por exemplo, os repasses da União são muito inferiores ao volume de impostos pagos pela população local. Se a população do oeste do estado defende que o governo do Estado está muito longe da realidade da região, por que eu não haveria de defender que o Rio Grande do Sul está “longe” de Brasília (longe no sentido de que há “poucas” obras federais aqui)? Pessoas que defendem essa idéia aqui são várias. Claro, existe bastante influência neo-nazista nessa idéia de separação do Sul, por isso sou contra! Mas também há muitos bons argumentos a favor da separação aqui. Por isso, seria meio hipócrita da minha parte defender a divisão do Pará, mas não defender a separação do Sul.
Ao citar o exemplo do Rio Grande do Sul, eu procuro chamar a atenção para o seguinte ponto: a solução para os problemas do Rio Grande do Sul está de fato na separação (do restante do Brasil), ou na revisão do pacto federativo? Talvez não morasse aí a solução para os problemas do Oeste do Pará? Li em vários fóruns a idéia de criarmos sub-zonas administrativas, com sede nas cidades mais importantes. Creio que isso já existe atualmente, sendo Santarém e Marabá sub-centros do Governo do Estado. A pergunta é: se existe, por que não funciona? Por que haveria de funcionar um novo governo, em um estado recém criado, se essa idéia de regionalização da administração não funciona?
Outra questão. Vamos assumir que o plebiscito foi aprovado, tudo foi devidamente discutido, e dividir é o melhor para a região. Com certeza essa idéia terá a aprovação da maioria em Santarém. Mas e se os eleitores de Jacareaganca, em sua maioria, responderem “não”? E se Novo Progresso responder “não”? E se Itaituba e Altamira responderem “não”? Eu não encontrei no Projeto de Decreto Legislativo 731/00 respostas para essa pergunta. De qualquer forma, gostaria de saber o que pensa a população do oeste do Pará, e sobretudo os defensores do movimento pró divisão, diante dessa possibilidade. Não sei se essa é uma realidade iminente (algum município não aprovar a criação do estado). O fato é que, ao contrário de Santarém, não vejo essa mesma empolgação pró Tapajós em Itaituba, Altamira, e em outras cidades. Esse inclusive pode ter sido um “tiro no pé” que o movimento pró divisão deu, ao concentrar a maior parte de suas ações, palestras, seminários, etc. na maior interessada na história, Santarém. Outro ponto: a divisão de um estado com certeza tem uma dimensão muito maior do que a eleição de um prefeito, ou governador, ou presidente. Um estado, mesmo não tendo elegido um presidente, aceita o novo presidente por fazer parte de um pacto federativo. Aqui, ao contrário, estamos discutindo a formação de um novo pacto, que a maioria da população de algum município pode não ter interesse em integrar.
Enfim, pontos a favor e contra são o que mais existem para a criação do novo estado. A pergunta é se estaríamos multiplicando por dois os problemas existentes, ao invés de dividir por três, ao dividir o estado do Pará. Creio que todos esses pontos serão levados a luz nas discussões sobre a divisão do estado que ocorrerá pré-plebiscito. Não sou contra a idéia de dividir o estado. Sou sim contra a perspectiva de Santarém se tornar, para o Tapajós, o que Belém é hoje, para o estado atual.
Abraços e obrigado,
Weverton Cordeiro
Porto Alegre, Rio Grande do Sul
http://www.inf.ufrgs.br/~wlccordeiro/

Nenhum comentário:

Postar um comentário